Foi hoje publicado no Diário da República o Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que aprova, em anexo, o Regime Jurídico das Contraordenações Económicas (RJCE). Como se pode ler no preâmbulo, o objetivo principal deste diploma consiste em resolver o problema da “disparidade no que se refere aos regimes sancionatórios previstos nos diversos diplomas que regulam a atividade económica, com particular destaque para os limites mínimos e máximos das coimas, e para a diversidade de autoridades competentes, que podem variar nas distintas fases do processo contraordenacional”, tendo em vista a maximização do bem-estar, da segurança e da proteção dos direitos dos consumidores, o regular funcionamento dos mercados e a competitividade da economia e a promoção da concorrência
Nos termos do art. 1.º-1 do RJCE, o “regime é aplicável às contraordenações económicas que sejam qualificadas por lei como tal”. Foi assim necessário alterar uma série de diplomas legais, neles se qualificando alguns ilícitos como contraordenações económicas. O art. 1.º-2 do DL 9/2021 indica os regimes alterados, podendo a sua extensão ser resumida no facto de a última alínea ser a impressionante alínea wwwwwww).
Entre os diplomas alterados, destacamos, em matéria de Direito do Consumo, os regimes da venda de bens de consumo e garantias, dos contratos celebrados à distância e fora do estabelecimento comercial, das práticas comerciais desleais, da indicação de preços, das práticas comerciais com redução de preço, da habitação periódica, das viagens organizadas e da resolução alternativa de litígios de consumo.
Em relação a este último diploma (Lei n.º 144/2015), assinalamos apenas um lapso na sua identificação. Com efeito, na alínea j) do art. 1.º-2, refere-se que se procede “à terceira alteração à Lei n.º 144/2015, de 18 de setembro, alterada pelo Decreto-Lei n.º 102/2017, de 23 de agosto, e pela Lei n.º 14/2019, de 12 de fevereiro, que transpõe a Diretiva 2013/11/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, sobre a resolução alternativa de litígios de consumo, e estabelece o enquadramento jurídico dos mecanismos de resolução extrajudicial de litígios de consumo”. Trata-se, na verdade, da quarta alteração, uma vez que o diploma também foi alterado, recentemente, pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro (Orçamento do Estado para 2021), que aditou um art. 4.º-C, sobre o apoio financeiro da administração local.
Voltando ao RJCE, salienta-se que as contraordenações económicas passam a ser classificadas como leves, graves e muito graves, tendo em conta a relevância dos bens jurídicos tutelados (art. 17.º). Os montantes das coimas (art. 18.º) dependem, por um lado, do escalão classificativo e, por outro lado, da natureza do agente. Os agentes podem ser qualificados como pessoa singular, microempresa (menos de 10 trabalhadores), pequena empresa (entre 10 e 49 trabalhadores), média empresa (entre 50 e 249 trabalhadores) e grande empresa (250 ou mais trabalhadores).
São considerados contraordenações leves, entre outros ilícitos, (i) o incumprimento do dever de informação relativo à resolução alternativa de litígios de consumo e (ii) a omissão da informação relativa a restrições geográficas a encomendas feitas online.
São considerados contraordenações graves, entre outros ilícitos, (i) as práticas comerciais desleais, (ii) a omissão da indicação do preço, (iii) o incumprimento das regras relativas às práticas comerciais com redução de preço, (iv) o incumprimento do prazo para a reparação ou substituição no prazo de 30 dias e sem grave inconveniente para o consumidor na venda de bens de consumo e (v) o incumprimento do dever de informação pré-contratual nos contratos celebrados à distância ou fora do estabelecimento comercial.
São considerados contraordenações muito graves, entre outros ilícitos, (i) o fornecimento de bens não solicitados e (ii) o não reembolso do valor pago pelo consumidor em caso de indisponibilidade do bem ou serviço encomendado à distância.
Deixamos uma última referência à Diretiva (UE) 2019/2161, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, que altera a Diretiva 93/13/CEE, do Conselho, e as Diretivas 98/6/CE, 2005/29/CE e 2011/83/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, a fim de assegurar uma melhor aplicação e a modernização das regras da União em matéria de defesa dos consumidores, cuja transposição irá implicar, necessariamente e em breve, uma alteração ao RJCE agora aprovado.
Com efeito, prevê-se na nova versão das diretivas relativas às práticas abusivas, à indicação de preços, às práticas comerciais desleais e aos direitos dos consumidores que “os Estados-Membros asseguram que [… as] sanções contemplam a possibilidade de aplicar coimas por meio de procedimentos administrativos ou de intentar uma ação judicial para a aplicação de coimas, ou ambas, sendo o montante máximo dessas coimas de, pelo menos, 4% do volume de negócios anual do profissional no(s) Estado(s)-Membro(s) em causa”. Ora, esta possibilidade não se encontra prevista no RJCE.