A procura por produtos e serviços online cresce exponencialmente. E para concretizar o contrato estabelecido entre o consumidor e a empresa, seja para compra de bens materiais ou para contratação de serviços, se faz necessário o aceite dos termos de uso e da política de privacidade.
Assim, o contrato de consumo estabelecido entre o consumidor e o fornecedor, além de respeitar as regras de direito vigente, em especial as de consumo, seja de Portugal, do Brasil ou de qualquer outro país que apresente regulação pertinente, também será regido pelos termos de uso e pela política de tratamento de dados desenvolvidos pela empresa em questão, disposições essas que o consumidor deve saber diferenciar.
Os termos de uso, de forma simplificada e bastante comum, tendem a enunciar os direitos, deveres, obrigações e responsabilidades das partes do contrato. E, bem assim, definem políticas de troca, desistência, suspensão e bloqueio do usuário da plataforma, a depender da atividade da empresa e o que ela oferece no mercado consumidor.
Por outro lado, a política de tratamento de dados ou política de privacidade, a qual pode ser publicitada em conjunto com os termos de uso ou não, traz informações acerca da utilização e coleta de informações do usuário-consumidor. Explica qual a finalidade do tratamento dos dados pessoais, quais dados pessoais serão coletados e utilizados. Ainda, se há partilha de tais informações com outros entes e até que momento os dados serão utilizados e armazenados.
No mesmo sentido, quando do tratamento, armazenamento e processamento de dados pessoais sensíveis e dados pessoais de crianças e adolescentes[1], estes devem ser realizados dentro das exceções legais. Em âmbito brasileiro, as regras pertinentes ao tratamento de dados pessoais e os princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet estão dispostas, respectivamente, na Lei nº 13.709/2018 (LGPD) e na Lei nº 12.965/20214 (Marco Civil da Internet) e em âmbito europeu temos o RGPD, aplicável desde 2018, que disciplina o tratamento de dados pessoais e a livre circulação desses dados.
De toda forma, as disposições devem ser de fácil compreensão e acessibilidade, respeitando o princípio da transparência, norteador das regras de tratamento de dados, conforme disposto no arts.5º, VI e 9º da LGPD[2] e arts.7, nº2 e 12º, nº 1 e 7 da RGPD[3]. Assim como o princípio da informação, um dos princípios base do direito do consumo.
Ainda, algumas empresas devem respeitar regras específicas de regulação de seu setor, como as atividades econômicas ligadas à saúde e o setor bancário.
Por isso, é de extrema relevância o consumidor estar ciente dos termos de uso e da política de tratamento de dados que adere quando da contratação online. Contudo, como bem tratado no texto do Professor Jorge Morais Carvalho – publicado também aqui no blog do NOVA Consumer Lab – Conhecimento completo e efetivo por quem use de comum diligência, até que ponto o consumidor ao contratar, lê e compreende as peculiaridades e letras pequenas do contrato?
Em realidade, o consumidor acaba por consentir, muitas vezes, com o tratamento de seus dados e aceita cláusulas contratuais sem as ler por inúmeras razões, nomeadamente pela influência do contexto do momento, em conjunto com o desejo de usar e comprar imediatamente, e a pura falta de cautela.
Mas, diria, também, que a falta de tempo para ler longas disposições, somada ao vocabulário técnico-jurídico não proporcionam o aumento da porcentagem daqueles que leem, sejam os termos de uso, seja a política de privacidade e tratamento de dados.
Para que essa realidade mude ou, pelo menos, melhore consideravelmente, os documentos devem ser trazidos ao consumidor de forma simplificada, clara, concisa e com linguagem acessível, de preferência com o mínimo necessário de termos técnicos.
Dessa forma, o consumidor de fato poderá compreender o que ali está disposto e, por consequência, escolher de forma consciente se adere ou não a determinado contrato e consentir com a utilização e tratamento de suas informações.
Uma possível alternativa a minimizar a essa questão é o uso da tecnologia, através do legal design, mais precisamente através do visual law, ferramenta que tem como objetivo transformar o modo como a informação jurídica é veiculada.
O visual law torna a comunicação a ser propagada mais acessível e simplificada. Para tanto, a técnica combina elementos visuais e textuais, de modo a permitir uma melhor compreensão do conteúdo transmitido para o indivíduo que precisa da solução jurídica.
O foco é a compressão facilitada da informação ao destinatário, no caso, aqui, o consumidor. Assim, tais documentos devem ser desenhados para que este compreenda facilmente a informação ali contida.
De maneira não exaustiva, é possível citar algumas ferramentas utilizadas para compor o visual law ,como vídeos, imagens, mapas, fluxogramas e gamificação. Tal técnica além de reduzir as longas laudas repletas de termos técnicos, também possibilita a inclusão de pessoas que têm dificuldade em compreender tais dizeres por não fazerem parte de seu cotidiano.
Frise-se, contudo, que o visual law não é a solução para o problema, mas ao menos permite, de forma mais democrática, a acessibilidade e compreensão dos termos e políticas de privacidade veiculados nas inúmeras plataformas e sítios online, visto que atualmente quase que inevitável a contratação de serviços e compras por essa via.
[1]Explique-se que, no Brasil, o ordenamento jurídico diferencia a pessoa menor de 18 anos em duas categorias, sendo criança a pessoa até 12 anos de idade incompletos e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade. Vide art. 2º do Estatuto da Criança e Adolescente – ECA.
[2]Art. 5º Para os fins desta Lei, considera-se (…) VI – transparência: garantia, aos titulares, de informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento e os respectivos agentes de tratamento, observados os segredos comercial e industrial;
Art. 9º O titular tem direito ao acesso facilitado às informações sobre o tratamento de seus dados, que deverão ser disponibilizadas de forma clara, adequada e ostensiva acerca de, entre outras características previstas em regulamentação para o atendimento do princípio do livre acesso
[3] Art. 7º (…) 2. Se o consentimento do titular dos dados for dado no contexto de uma declaração escrita que diga também respeito a outros assuntos, o pedido de consentimento deve ser apresentado de uma forma que o distinga claramente desses outros assuntos de modo inteligível e de fácil acesso e numa linguagem clara e simples. Não é vinculativa qualquer parte dessa declaração que constitua violação do presente regulamento.
Art. 12. 1. O responsável pelo tratamento toma as medidas adequadas para fornecer ao titular as informações a que se referem os artigos 13. e 14. e qualquer comunicação prevista nos artigos 15. a 22. e 34. a respeito do tratamento, de forma concisa, transparente, inteligível e de fácil acesso, utilizando uma linguagem clara e simples, em especial quando as informações são dirigidas especificamente a crianças. As informações são prestadas por escrito ou por outros meios, incluindo, se for caso disso, por meios eletrónicos. Se o titular dos dados o solicitar, a informação pode ser prestada oralmente, desde que a identidade do titular seja comprovada por outros meios. (…) 7. As informações a fornecer pelos titulares dos dados nos termos dos artigos 13.o e 14.o podem ser dadas em combinação com ícones normalizados a fim de dar, de uma forma facilmente visível, inteligível e claramente legível, uma perspetiva geral significativa do tratamento previsto. Se forem apresentados por via eletrónica, os ícones devem ser de leitura automática.