A GOVERNANÇA NA AGENDA “ESG” E O MUNDO CORPORATIVO PÓS COP-26

Doutrina

Na semana em que se encerra a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP-26), principal cúpula da ONU para debate sobre questões climáticas, realizada entre os dias 1 e 12 de novembro deste ano, em Glasgow, na Escócia e atendendo ao desafio de pesquisa que tem seguido o NOVA Consumer Lab sobre os pilares do ESG, já tratado anteriormente aqui e aqui, é chegada a hora da análise do impacto da responsabilidade da governança nas tomadas de decisão corporativa.

Na análise do tema ESG nos dias atuais, aparentemente o “G”, representante do pilar “Governance”, tem sido frequentemente esquecido em detrimento da prioridade que vem sendo dada aos elementos relacionados a questões climáticas e implicações sociais na análise de riscos e oportunidades empresariais.

A governança, entretanto, refere-se a fatores essenciais da tomada de decisão corporativa quando relacionada diretamente ao “modus operandi” de como as companhias devem se coordenar internamente, partindo desde o estabelecimento da ética e valores corporativos, passando por toda estrutura organizacional, até o delineamento das estratégias empresariais, política de transparência, sistemas de compliance e direitos dos acionistas. Importa ressaltar aos consumidores, muitas vezes desavisados, que é justamente este elemento que esteve no centro de alguns dos recentes e maiores escândalos empresariais, como foi no caso da “Dieselgate” pela Volkswagen, ou no caso da fuga de dados, pelo Facebook.

Ambos os casos, como se sabe, estão relacionados a possível ausência de uma governança diligente.

Práticas antiéticas como clientelismo, conflitos de interesse ou práticas comerciais impróprias podem ter um impacto devastador sobre uma empresa e seus acionistas, mas ainda pior sobre os consumidores. São os fatores inseridos na letra “G” que indicam as regras e procedimentos para países e corporações que permitem que os investidores e consumidores selecionem as práticas de governança que consideram adequadas, assim como fariam para questões ambientais e sociais.

São ainda consideradas questões de governança de alto perfil o modelo de gestão, como é o caso da política de responsabilidade social corporativa, ou ainda a promoção do respeito pelos Direitos Humanos, nos domínios da não discriminação e igualdade de oportunidades, liberdade de associação e negociação coletiva. Todos elementos que apontam para o fato de que a boa governança mitiga e controla os riscos para evitar má gestão, escândalo potencial e sanções regulatórias.

Em uma pesquisa realizada, recentemente, pela empresa financeira americana MSCI Inc., ainda que a longo prazo as questões ambientais e sociais agregadas ao setor empresarial tenham maior impacto financeiro e influenciem mais a exposição de uma companhia, resta demonstrado que, a curto prazo, os indicadores de governança apresentam os melhores resultados a nível financeiro.

A União Europeia reforça a importância dos aspetos de Environmental, Social and Governance (ESG) para os investidores, ao promover a Diretiva de Informação Não Financeira (2014/95/UE), já transposta para a legislação portuguesa através do Decreto-Lei n.º 89/2017, de modo que grandes empresas que sejam entidades de interesse público estejam obrigadas a divulgar informações não financeiras relativas às áreas sociais, ambientais e de governo societário. 

Sendo ainda mais ousada, a CMVM disponibilizou, em fevereiro deste ano, um modelo de relatório, não vinculativo, “para a divulgação de informação não financeira pelos emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação, em particular a informação relativa a fatores ambientais, sociais e de governação (“environmental, social and governance“, ESG)”.

A divulgação do ESG tem sido uma prioridade na agenda dos reguladores globais. A UE foi pioneira, lançando módulo por módulo, com base no plano de ação geral lançado em 2018, e segue com bons exemplos que se estendem até agora, incluindo benchmarks climáticos e o Regulamento de Divulgação de Finanças Sustentáveis ​​(SFDR).

Outras jurisdições estão seguindo o exemplo. A questão está recebendo cada vez mais atenção dos reguladores dos EUA, com a política climática sendo uma das principais prioridades do governo Biden. Ainda assim, é fundamental passar da agenda à ação.

Esse foco tem se demonstrado como o principal ponto de alinhamento global quando, para além de dados financeiros, a responsabilidade corporativa hoje fundamenta-se, sobretudo, no cumprimento de novas regras que vão, para além de números monetários, aos números associados à transição climática, atitudes sociais, políticas culturais e de gênero, transparência, valores éticos e boa governança.

Ainda há mais trabalho a fazer e esperamos que a COP26 leve a ações mais concretas. Sabemos que a implementação de uma agenda em favor do ESG demanda tempo e exige um cronograma gradual para uma implementação viável, mas é importante estar atento ao devido valor de cada um dos elementos inerentes a esta nova realidade para não a perder de vista.

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