Ventos de mudança na remoção e substituição das baterias portáteis

Doutrina

Quantos de nós consumidores já nos deparámos com a situação em que um aparelho portátil, como por exemplo smartphones, ainda se encontra em perfeitas condições de hardware, software ou estado de conservação, mas a sua bateria tem uma durabilidade nula ou quase nula? Quantos de nós é que já nos vimos obrigados a substituir as baterias desses aparelhos em lojas próprias ou autorizadas porque, de outro modo, é impossível ou arriscado manter o bom funcionamento do mesmo? A verdade é que, frequentemente, a vida útil do aparelho e da sua bateria não coincidem, tal como já tivemos oportunidade de analisar em texto anterior de José Filipe Ferreira, para o qual se remete.

Porém, naquilo que se esperam ser boas notícias para os consumidores europeus, o artigo 11.º da Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às baterias e respetivos resíduos foi desenhado para, pelo menos, remodelar esta realidade. É, pois, proposto que, doravante, as baterias portáteis[1] incorporadas em aparelhos possam ser facilmente removíveis e substituíveis pelo utilizador final ou por operadores independentes durante a vida útil do aparelho, se a vida útil das baterias for inferior ou, o mais tardar, no fim da vida útil do aparelho. A Proposta de Regulamento também esclarece que se deverá considerar que uma bateria é facilmente substituível quando, ao retirar a mesma do aparelho, este último pode funcionar com uma bateria semelhante, sem que isso afete o funcionamento ou o desempenho do aparelho.

Como bem se compreende, esta inovação poderá representar uma pedra no charco naquele que é o paradigma atual quanto à remoção e substituição de baterias portáteis. Veja-se, por exemplo, o caso da Apple em que nos diversos aparelhos (iPhone, iPad, Apple Watch, etc.) a substituição das baterias, por um utilizador final leigo na matéria, é praticamente impossível de realizar e, mesmo que seja feita por profissionais – que não a Apple ou as lojas por si autorizadas -, não há qualquer proteção para os consumidores, caso a remoção e substituição afete o desempenho dos aparelhos.

Assim, a obrigação que a Proposta de Regulamento prevê afigura-se como bastante benéfica para os consumidores, pois oferecerá aos mesmos a possibilidade de substituírem, por si próprios, as baterias em causa, assim como terão mais opções de escolha, caso pretendam recorrer a operadores profissionais, sem que sobre essas decisões paire a quase certeza de diminuição da qualidade e desempenho do aparelho que atualmente se verifica.

Adicionalmente, esta facilidade em dar uma segunda vida aos aparelhos poderá, igualmente, conduzir a uma redução do consumo, na medida em que, não raras vezes, a opção dos consumidores passa por comprarem novos aparelhos, pois os custos e riscos inerentes à substituição das baterias não compensa o investimento. Acresce que a estatuição da obrigação que aqui se analisa poderá, também, ter a virtude de levar os fabricantes a investirem em baterias com uma vida útil mais longa, evitando-se assim a necessidade de aquisição de novas baterias e promovendo-se, deste forma, o consumo sustentável.

Por fim, é importante não esquecer que o artigo ora analisado está incluído numa Proposta de Regulamento – a qual conheceu vários avanços durante a Presidência Portuguesa do Conselho Europeu – mas que, até à aprovação final, a acontecer, provavelmente, ainda em 2021, poderá conhecer alterações. Assim, somente com a versão final do Regulamento, bem como com a sua produção de efeitos concretos no mercado, é que será possível compreender se estamos perante verdadeiros ventos de mudança ou se, em contrapartida, não assistimos a uma mera brisa não refrescante.


[1] Para efeitos da Proposta de Regulamento, classificam-se como baterias portáteis aquelas que: (i) são fechadas hermeticamente, (ii) pesam menos de 5 kg, (iii) não são concebidas para fins industriais e (iv) não são baterias de um veículo elétrico nem baterias de um automóvel.