Prazo para a reparação ou substituição ao abrigo da garantia legal

Doutrina

Em caso de uma falta de conformidade do bem com o contrato que se manifeste dentro do período de responsabilidade do profissional, o consumidor tem direito à reposição da conformidade, através de reparação ou de substituição (art. 15.º-1 do DL 84/2021).

Segundo o art. 18.º-1-a), a reparação ou a substituição deve ser efetuada a título gratuito, ou seja, nos termos do art. 2.º-a), “livre dos custos necessários incorridos para repor os bens em conformidade, nomeadamente o custo de porte postal, transporte, mão-de-obra ou materiais”. A lista não é exaustiva, pelo que outras despesas relativas à reposição da conformidade do bem, como custos com peritagens ou avaliações, devem considerar-se incluídas. Portanto, o consumidor não tem de pagar qualquer valor pela reparação, incluindo os custos do transporte do bem para o vendedor.

Nos termos do art. 18.º-2-b), a reparação ou a substituição deve ser efetuada num prazo razoável, ou seja, o “mais curto prazo necessário para a sua conclusão” (considerando 55 da Diretiva 2019/771).

Nesse mesmo considerando, pode ler-se que “os Estados-Membros deverão poder interpretar o conceito de prazo razoável para a conclusão da reparação ou da substituição, prevendo prazos fixos que podem ser geralmente considerados razoáveis para a reparação ou substituição, em especial no que respeita a categorias específicas de produtos”.

Utilizando esta possibilidade, prevê-se no art. 18.º-3 que “o prazo para a reparação ou substituição não deve exceder os 30 dias, salvo nas situações em que a natureza e complexidade dos bens, a gravidade da falta de conformidade e o esforço necessário para a conclusão da reparação ou substituição justifiquem um prazo superior”.

Esta norma é particularmente infeliz. Sob a aparência de melhorar a posição do consumidor, por se prever um prazo fixo, vem, na verdade, apresentar-se esse prazo como mínimo, permitindo a sua extensão nas situações aí indicadas. Na verdade, pouco se acrescenta em relação à cláusula geral do prazo razoável, que perde efeito. Temos dúvidas, até, que, na Diretiva, se esteja a pensar em prever simultaneamente a cláusula do prazo razoável e a previsão de um prazo fixo.

Os profissionais que não pretendam cumprir o prazo de 30 dias irão sempre invocar uma das exceções constantes do preceito, o que irá também aumentar consideravelmente a litigiosidade.

É, no entanto, necessário ter em conta um requisito adicional relativo à reposição da conformidade que pode limitar os efeitos negativos para o consumidor de uma reparação ou de uma substituição mais prolongada no tempo.

Assim, a reparação ou a substituição deve ser efetuada também, como prevê o art. 18.º-2-c), “sem grave inconveniente para o consumidor, tendo em conta a natureza dos bens e a finalidade a que o consumidor os destina”.

A concretização do conceito indeterminado de “grave inconveniente” deve ter em conta o caso concreto, relevando, nomeadamente, circunstâncias relativas à relação entre o consumidor e o bem.

A reposição da conformidade terá de ser feita em menos de 30 dias se o consumidor tiver um grave inconveniente com a reparação ou a substituição nesse prazo. É o que sucederá na generalidade dos casos.

Causa grave inconveniente ao consumidor não ter telemóvel durante 30 dias? À partida, se não tiver outro, a resposta será positiva. Isto significa que a reposição da conformidade em 30 dias não cumpre os requisitos previstos na lei. Na verdade, ficar sem telemóvel por mais de um ou dois dias já causará grave inconveniente a um consumidor normal. Isto significa que, em regra, um ou dois dias é o prazo máximo para a reparação ou a substituição do telemóvel sem ser causado um grave inconveniente ao consumidor. Estas observações valem para a generalidade dos bens, relembrando-se que a análise deve ser feita em concreto.

O profissional poderá utilizar, ainda assim, o tempo razoável para as operações de reparação ou de substituição, mas tem de fazer alguma coisa para que o consumidor não tenha um grave inconveniente. A solução mais adequada, nestes casos, passa pela disponibilização de um bem de substituição que satisfaça as necessidades do consumidor enquanto o bem reparado ou o novo bem não é entregue.

A ausência de reposição da conformidade a título gratuito, num prazo razoável (em princípio, 30 dias) e sem grave inconveniente para o consumidor, além de constituir ilícito contraordenacional, nos termos do art. 48.º-1-d), permite ao consumidor exercer de imediato o direito à redução do preço ou de resolução do contrato, como prevê o art. 15.º-4-a)-ii). Refira-se ainda que, segundo o art. 16.º, “nos casos em que a falta de conformidade se manifeste no prazo de 30 dias após a entrega do bem, o consumidor pode solicitar a imediata substituição do bem”. Neste caso, a substituição deve ser imediata, não se permitindo sequer ao profissional avaliar previamente a existência de falta de conformidade. Essa avaliação terá de ser feita apenas posteriormente.

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *